terça-feira, 10 de janeiro de 2012

LIBRAS III

Universidade Federal de Santa Catarina
Licenciatura em Letras-Libras na Modalidade a Distância




Aline Lemos Pizzio
Ana Regina e Souza Campello
Patrícia Luiza Ferreira Rezende
Ronice Muller de Quadros




Língua Brasileira de Sinais III





                                             



Florianópolis, 2010

Capítulo 1
Uso do espaço
           
Na língua de sinais brasileira, assim como verificado na ASL (Siple, 1978), as relações gramaticais são especificadas através da manipulação dos sinais no espaço. As sentenças ocorrem dentro de um espaço definido na frente do corpo, consistindo de uma área limitada pelo topo da cabeça e estendendo-se até os quadris. O final de uma sentença na língua de sinais brasileira é indicado por uma pausa. A figura (1) ilustra o espaço de realização dos sinais na língua de sinais brasileira, conforme Langevin & Ferreira Brito (1988).

FIGURA 1: Espaço de realização dos sinais na LIBRAS
( Langevin & Ferreira Brito, 1988:01 )


A língua de sinais brasileira, assim como qualquer língua de sinais, é organizada espacialmente, de forma bastante complexa. O uso do espaço é uma característica fundamental nas línguas visual-espaciais e está presente em todos os níveis de análise. No que se refere ao nível fonológico, um mesmo sinal pode ser realizado em diferentes locais, dentre eles o espaço neutro, que corresponde à área localizada na frente do sinalizante.
Dependendo do ponto utilizado no espaço para a realização de um sinal, pode haver a produção de sinais com diferentes referentes. Veja alguns exemplos:

Referente é o que é indicado/referido no contexto relacionado com os interlocutores no discurso.
Para saber mais sobre a Teoria da Referência veja


CASA
Aquela Casa Ali

Aquela casa lá
 
Esta casa do lado direito


Esta casa adiante



CARRO

Aquele carro



O carro atrás
O carro à frente

O carro à esquerda
O carro à direita


Vejam que a realização de um sinal em um determinado ponto no espaço implica em mudanças de significados relacionadas com o referente, ou seja, está ligada a questões semânticas. Quando se quer ser específico quanto ao referente, é possível realizar um sinal em uma determinada localização.
Além disso, se o mesmo sinal for reproduzido em diferentes pontos do espaço, estaremos entrando no campo morfológico, pois poderemos estar incorporando movimentos que indicam marcação de plural e flexão verbal.
            No nível sintático, o uso do espaço é explorado para estabelecer as relações gramaticais entre os referentes. No eixo temático de estudos lingüísticos e línguas de sinais IV, estaremos aprofundando ainda mais estas questões, pois o uso do espaço é um dos componentes mais importantes das línguas de sinais, além de ser universal, ou seja, todas as línguas de sinais estudadas até então apresentam esse componente lingüístico visual-espacial.


Capítulo 2

Classificadores

Leitura obrigatória:
FELIPE, T. (2002) Sistema de flexão verbal na libras: os classificadores enquanto marcadores de flexão de gênero. Anais do Congresso Nacional do INES de 2002.

Roteiro para a análise:


Leia o texto de FELIPE e faça um levantamento de mais três exemplos da LIBRAS para cada tipo de classificador encontrado nessa língua:
·         Especificadores de tamanho e forma
·         Classificador semântico
·         Classificador corpo
·         Classificador parte do corpo
·         Classificador instrumento
Após o roteiro de análise, capture nos vídeos do Nelson Pimenta os classificadores e compartilhe com a sua turma.



2.1. Classificadores nas línguas faladas

Classificadores representam a relação entre significação-função em um dado contexto dentro do sistema de uma determinada língua, como escreve Dubois et alli (apud Tanya A. Felipe, 2002, p.37-58): Chama-se classificador um afixo utilizado, em particular nas línguas negro-africanas, para indicar a que classe nominal pertence uma palavra (sin.: índice de classe).
Em várias línguas apresentavam diversas categorias, como determinantes, quantificadores, modificadores, de medida, de espécie (de Lyons, em 1977), e outras denominações. Linguistas, como Allan, em 1977, estabeleceu os critérios para definir as suas classificações: eles se realizam como morfemas na estrutura de superfície sob condições específicas; eles têm significado, já que os classificadores denotam alguma característica saliente ou imputada a uma entidade que é referida por um nome.
Na conclusão de Allan, os sistemas de classificadores existentes nas línguas faladas constituem um conjunto completo e universal e, por isso, agrupam-se em quatro tipos, conforme observado em mais de cinqüenta línguas classificadoras. São eles:

1.      Línguas de classificador numeral: são línguas em que um classificador é obrigatório em muitas expressões de quantidade e em expressões anafóricas e dêiticas, como, por exemplo, a língua Thai;
2.      Línguas de classificador concordante: são línguas em que os classificadores são afixados (geralmente prefixos) aos nomes e seus modificadores, predicados e pró-formas como, por exemplo, em muitas línguas africanas (Bantu e Semi-Bantu) e australianas;
3.      Línguas de classificador predicativo: são línguas que possuem verbos classificadores, que variam seu radical de acordo com as características das entidades que participam enquanto argumentos do verbo como, por exemplo, os verbos de movimento/localização em Navajo, Hoijer (1945), e verbos classificadores em outras línguas Athapaskan;
4.      Línguas de classificador intra-locativo: são línguas nas quais classificadores nominais são embutidos em expressões locativas que obrigatoriamente acompanham nomes em muitos contextos. Existem apenas três línguas: Toba, uma língua sul-americana, Eskimo e Dyirbal, uma língua do noroeste da Austrália.

O número de classificadores nas línguas pode variar, mas sete categorias de classificação podem ser encontradas: (i) material; (ii) formato; (iii) consistência; (iv) tamanho; (v) localização; (vi) arranjo e (vii) quantia. Os classificadores podem combinar duas ou mais categorias e elas podem ser também subdivididas.
Para entender melhor, observe nos quadros abaixo:


Material
Animado (animais e pessoas, também reclassificada como mulher, homem e criança) e inanimado (árvores, objeto de madeira, etc.)
Formato
Subdividida em objetos longos, planos e arredondados (que podem ser em uma, duas ou três dimensões) e se associa com outras categorias, como consistência, textura, etc. Existem três subcategorizações, como proeminência de curva exterior, objetos com o interior vazio, e também tem relação com a quantia.
Consistência
Tem três subdivisões: flexível, rígido e não-definido. Está associado com material e forma
Tamanho
É subdivida em grande e pequeno/a e está associada à forma
Localização
Relaciona um lugar e está associada com o tipo de objeto
Arranjo
Relaciona objetos colocados de uma maneira especifica
Quantia
Relaciona uma quantidade e é subdividida em coleção, volume, peso e tempo.

Diversos linguistas, como Hoijier (1945), Carter (1966), Haas (1967), Friedrich (1970), Adams e Conklin (1973), Allan (1977), Denny (1980), Shachter (1985) e Hiyomi (1992), nas suas pesquisas, chegaram às seguintes conclusões:
1)      Há uma certa relação entre os classificadores associados aos tipos de língua classificadora. Embora tenham encontrado alguns tipos diferentes de classificadores que podem estar ligados a uma função morfossintática, que no seu processo de classificar, acrescenta um radical nominal ou verbal ou uma derivação interna da raiz, em todas as línguas de classificadores coordenantes;
2)      Na morfossintaxe, os morfemas classificadores podem ser relacionados como marca de concordância de gênero, de número, de caso, ou de lugar;
3)      Os tipos de verbos podem trazer características semânticas e não sintáticas, e sua classificação pode conter a sua significação, no caso de instrumento, paciente ou tema;
4)      No nível morfológico, não há um sistema de morfemas, enquanto uma subclasse de verbos que concordam com seu sujeito ou objeto em relação às categorias de material e de formas. O mesmo acontece em relação a verbos que usam traços semânticos incorporados à categoria arranjo.
 

2.1.1. Classificadores verbais[1]

2.1.1.1. Propriedades dos classificadores verbais

Os classificadores verbais aparecem no verbo categorizando o referente dos seus argumentos em termos de forma, consistência, tamanho, estrutura, posição e animacidade. Eles sempre se referem ao argumento de um predicado e podem co-ocorrer com ele. A escolha de um classificador é geralmente uma escolha semântica, sendo que cada substantivo de um língua não necessariamente precisa de um classificador verbal. Alguns substantivos podem ser associados a mais de um classificador. A escolha de um classificador é baseada muito mais em uma seleção lexical do que em relação à concordância gramatical, ficando muitas vezes limitada a grupos semânticos de verbos.

2.1.1.2. Realização dos classificadores verbais

            Em muitas línguas, os classificadores verbais são opcionais e são determinados pela função discursiva dos substantivos de um predicado adicional. Eles podem ser usados para manter a referência de um substantivo dentro de uma narrativa, podem também reintroduzir os participantes e podem ser usados anaforicamente.

2.1.1.3. Tipos de classificadores verbais:

1) Incorporação classificatória de substantivos:
É a incorporação de um substantivo ao verbo para caracterizar um argumento externo, geralmente em função de sujeito (S) ou de objeto (O). Frequentemente há uma relação de genérico-específico entre o argumento incorporado e o argumento externo que o acompanha. De qualquer forma, os classificadores verbais incorporados caracterizam o referente de um substantivo em termos de sua forma, consistência e animacidade.
Aikhenvald (2000) apresenta como exemplos algumas línguas prefixais do norte da Austrália, em que um substantivo genérico, o qual descreve o substantivo específico correspondente na função de S ou O, pode ser incorporado ao verbo. Como exemplo, temos o Mayali que apresenta um conjunto de quarenta classificadores verbais, conforme ilustrado abaixo:.

a)      Classificador verbal referente a um substantivo com função de objeto:
ga-yaw-garrm-e                                             al-daluk
            3/3-GEN.CL:BEBÊ-ter-NP                           CLII-mulher
            ‘Ela tem um bebê menina’.
           
b)      Classificador verbal com função de sujeito:
ga-rrulk-di                                                      na-dubang
3NP-GEN.CL:ÁRVORE-ERGUIDA(NP)             CLIII-árvore-pau-ferro
‘Uma árvore de pau ferro está lá’

Entretanto, a incorporação de substantivos e os classificadores verbais podem ser vistos como categorias distintas. Este é o caso da língua Mayali, que tem composição lexical não produtiva, incorporação de partes do corpo e, também, classificadores verbais (chamados por Evans (1996) de incorporação classificatória genérica). A composição lexical é um processo não-produtivo e constitui um sistema fechado obrigatório. Em oposição, a incorporação de partes do corpo e os classificadores verbais são opcionais, sendo que a escolha entre construções com incorporação ou sem incorporação dependerá do status discursivo do constituinte nesta língua.
Duas diferenças entre incorporação de partes do corpo e classificadores verbais são encontradas:
(a)                           Os classificadores verbais são uma classe fechada de aproximadamente 40 membros de maioria inanimada, enquanto as partes do corpo são uma classe semi-aberta;
(b)                          Duas partes do corpo em uma relação parte-todo podem ser incorporadas juntas em um verbo, enquanto dois classificadores verbais não podem co-ocorrer.
A composição lexical e os classificadores verbais podem co-ocorrer na mesma palavra.

2) Classificadores verbais afixados ao verbo:
Classificadores verbais podem ser realizados com prefixos ou sufixos, mas nunca são expressos com repetidores. Na língua Imonda, existem aproximadamente 100 classificadores verbais, mas nem todos os verbos aceitam classificadores. Eles caracterizam um substantivo, em função de S ou de O, em relação as suas propriedades inerentes, tais com forma.

sa                    ka-m                põt-ai-h-u
coco    1SG-ALVO    CL:FRUTA-dar-RECIPIENTE-IMPERATIVO
‘Dá-me o coco.’

Sistemas de classificadores verbais como afixos variam em seu tamanho e na sua semântica. Em Terena, existem dúzias de classificadores que caracterizam os argumentos S/O em relação ao tamanho, forma, aspecto e animacidade. Como exemplo, temos – pu’i (redondo), a seguir:

oye-pu’i-co-ti
cozinhar-CL:REDONDO-TEMA-PROGR
‘Ele está cozinhando (coisas redondas).’

Em línguas classificadoras múltiplas, os classificadores são usados freqüentemente em verbos. Em Mundurukú, por exemplo, há um sistema múltiplo de classificadores com mais de 100 morfemas para referir forma e aspecto. Os índices acima de cada parte da língua representam os tons, pois essa é uma língua tonal.

Veja o que são línguas tonais


a2ko3-ba4                                                i3-ba2-dom3
banana-CL:COMPRIDA RÍGIDA        3SG.POSS-CL: COMPRIDA RÍGIDA-ficar+FUT
ko4be3             be3
canoa               loc
‘Uma banana ficará na canoa.’

Esse tipo de classificador geralmente se desenvolve a partir da incorporação classificatória de substantivos. Às vezes os dois tipos coexistem em um enunciado, refletindo diferentes estágios de gramaticalização.

3) Verbos classificatórios supletivos:
            Raízes verbais supletivas, geralmente referenciadas como verbos classificatórios, são raras nas línguas do mundo. A seleção de uma raiz é condicionada por propriedades do referente do constituinte S ou O. Os verbos classificatórios, ao contrário dos verbos apresentados no tipo II, não podem ser usados em outras funções classificadoras. Entretanto, verbos classificatórios mostram certas correlações com números e com outras categorias verbais flexionais (imperativos, aspectos, tempo, pessoa).
            Os verbos classificatórios se enquadram em duas categorias:
(A) eles podem ser usados para categorizar o argumento S/O em termos de suas propriedades inerentes: esse tipo de verbo classificatório é predominantemente encontrado em línguas indígenas norte-americanas, em línguas Tibeto-Burman e em Ika, uma língua do norte da Colômbia.
(B)  eles podem ser usados para categorizar o argumento S/O em termos de sua orientação e posição no espaço, com suas propriedades inerentes, assim como nas línguas de sinais.

2.1.1.4. Interação entre os três tipos de classificadores verbais:
            A incorporação classificatória de substantivos é uma origem freqüente dos classificadores verbais como afixos. Muitas raízes classificatórias ‘iniciam a vida’ como substantivos, sendo usadas com um escopo restrito e posteriormente sendo usadas como genéricos. A gramaticalização de substantivos incorporados pode resultar na criação de raízes classificatórias supletivas.
            Ao contrário dos classificadores verbais como afixos, a incorporação classificatória de substantivos não é usada em outros ambientes classificadores em línguas classificadoras múltiplas, ela é restrita apenas ao seu contexto gramatical. Substantivos são incorporados em verbos e esses mantêm a mesma estrutura do argumento. O substantivo incorporado é usado como um meio de categorizar um argumento expresso.

2.1.1.5. Classificadores verbais e a função sintática do argumento
            Os classificadores verbais indicam a presença de um NP (sintagma nominal) de superfície. Em cada língua, esse NP pode estar na função de S ou de O, ou seja, eles operam em bases absolutas. Em algumas poucas línguas, os classificadores verbais podem também se referir a argumentos periféricos (adjuntos e complementos).

Adjuntos e complementos: veja a diferença entre esses dois termos em:
http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=gramatica/docs/adjuntocomplemento

            Em Motuna, os classificadores verbais podem indicar a presença de um argumento S, ou O, ou então um argumento periférico. Em Tarascan, os classificadores verbais se referem frequentemente a um argumento locativo. Nesta língua, há 32 sufixos verbais de espaço ‘locativo’, o qual significa as características de uma locação, incluindo sua dimensão e forma.



2.1.1.6. Combinação de diferentes tipos de classificadores verbais
           
Neste item, serão apresentadas algumas combinações de diferentes tipos de classificadores verbais.  Foram analisados dados de línguas que têm sistemas distintos de classificadores em distribuição complementar, e de línguas que têm classificadores verbais afixados e verbos classificatórios como sistemas distintos. Entretanto, quanto à combinação de incorporação classificatória de substantivos e classificadores verbais afixados como sistemas diferentes, não foi encontrada nenhuma língua com essa característica. Também não é conhecida nenhuma língua que combine incorporação classificatória de substantivos e raízes verbais classificatórias.      

Com as diversas tipologias para classificação de classificadores das línguas faladas, os lingüistas perceberam que a língua de sinais possui uma classificação semelhante, assim como todas as línguas do mundo.

2.2. Classificadores nas línguas de sinais

O classificador é um tipo de morfema, utilizado através das configurações de mãos que podem ser afixado a um morfema lexical (sinal) para mencionar a classe a que pertence o referente desse sinal, para descrevê-lo quanto à forma e tamanho, ou para descrever a maneira como esse referente se comporta na ação verbal (semântico).

Para acompanhar a análise dos classificadores, segue abaixo a tabela das Configurações de Mãos - CM (quadro de CM da LSB Vídeo).
 
Os classificadores utilizam configurações de mãos que representam alguma propriedade física de uma classe. A seguir apresentamos alguns exemplos de configurações de mãos (CM) para classificadores de tamanho e forma (baseado em Supalla, 1982):

Categoria
CM
Exemplos de CL:
Fino

5
45
BARRA-FERRO-CONSTRUÇÃO
FIO-DENTAL-FINO
Plano
56 ou 53
MESA-PLANA
TELHADO-RETO
PORTA-ARMÁRIO-RETA
Plano com ângulo
30
PRATELEIRA
ESTANTE
Espessura fina
17
45
LÂMINA-FERRO
LIVRO-FINO
ALIANÇA-FINA
Espessura média
18
LIVRO-MÉDIO
ALIANÇA-MÉDIA
Espessura grossa
19
LIVRO-GROSSO
ALIANÇA-GROSSA
Espessura grossa e densa
28
ESPESSURA-MESA
ESPESSURA-SAPATO
Arredondado
22
CABO-VASSOURA
CANO
Arredondado médio e grosso
29
LUMINÁRIA-ARREDONDADA
CANECA-COPO
Retângulo
18
REGUA
FAIXA-TESTA
FAIXA-CABELO
Quadrado
38
PORTA-RETRATO
CAIXA-CD
QUADRO
Largura
14
53
MEDIDA DE ALGUMA COISA PEQUENA
MEDIDA DE ALGUMA COISA GRANDE
Altura
56
HOMEM-ALTO
HOMEM-BAIXINHO
OBJETO-NO-ALTO
OBJETO-EM-BAIXO

Esses classificadores podem incorporar algum tipo de ação, vejam exemplos a seguir:

CANO—AMOLECEU
PRATELEIRAS-CAIRAM
QUADRO-CAIU
FOLHA-CAIU-NO-AR
COMETA-CAIU
ESTRELA-CADENTE

A seguir apresentamos alguns exemplos de configurações de mãos (CM) para classificadores de entidades (baseado em Supalla, 1982):

Categoria
CM
Exemplos de CL:
Humano – 1 pessoa

14


49
48
PESSOA/RÔBO/ET-PASSANDO-UMA-PELA-OUTRA
PESSOA/RÔBO/ET-PASSANDO
PESSOA/RÔBO/ET-ANDANDO
PESSOA-CAINDO
PESSOA-DEITADA
PESSOA-PARADA
Humano – 2 pessoas
49
2-PESSOAS/RÔBO/ET-PASSANDO
Humano – 3 pessoas
51
3-PESSOAS/RÔBO/ET –PASSANDO
Humano – 4 pessoas
54
4-PESSOAS/RÔBO/ET-PASSANDO
Humano – 5 ou mais pessoas
61
PLATÉIA-EM-AUDITÓRIO
MUITAS-PESSOAS-CAMINHANDO
MUITAS-PESSOAS-VINDO
Animal andando
07 (grandes animais)
48 ou 56 (animais em geral, especialmente, de pequeno porte)
36 (aves em geral)
ELEFANTE-ANDANDO
CACHORRO-ANDANDO

GATO-ANDANDO
AVES-ANDANDO
Animal nadando
57
PEIXE-NADANDO
GOLFINHO-NADANDO
Animal rastejando
57
14
JACARÉ-RASTEJANDO
COBRA-RASTEJANDO
LESMA-RASTEJANDO
Animal voando

61
BORBOLETA-VOANDO
PÁSSARO-VOANDO
Animal pulando
58
COLEHO-PULANDO, SAPO-PULANDO
Veículos em geral em locomoção
57
AVIÃO-LOCOMOVENDO-SE
ÔNIBUS-LOCOMOVENDO-SE
TREM-LOCOMOVENDO-SE
METRÔ-LOCOMOVENDO-SE
CAMINHÃO-LOCOMOVENDO-SE
Veículos de duas rodas em locomoção
57
MOTO-LOCOMOVENDO-SE
BICICLETA-LOCOMOVENDO-SE


A categoria “humano” inclui todos os seres que apresentam a configuração física humana, mesmo não sendo necessariamente humanos de fato, tais como, robôs, seres extraterrestres, etc.

A seguir apresentamos alguns exemplos de configurações de mãos (CM) para classificadores manuais (incluindo verbos manuais e verbos classificadores) (baseado em Sandler e Lillo-Martin, 2006 e Ferreira-Brito, 1995):





Categoria de verbos manuais


CM
Exemplos de CL:
17 e 44
PINCELAR
PEGAR-LÁPIS
PEGAR-FOLHA

28
PEGAR-LIVRO
PUXAR-PRATEIRA
1 e 7
PASSAR-ROUPA
PINTAR-COM-PINCEL-GROSSO
PINTAR-COM-ROLO
COZINHAR
VARRER

29

PEGAR-CELULAR
PASSAR-ESCOVA-SAPATO


Tipos de classificadores encontrados nas línguas de sinais

1) Classificadores descritivos
As descrições visuais podem ser captadas de acordo com as imagens dos objetos animados ou inanimados. Observam-se aspectos tais como: som, tamanho, textura, paladar, tato, cheiro, “olhar”, sentimentos ou formas visuais, bem como a localização e a ação incorporada ao classificador. Essa classificação pode ter até três dimensões:
a)      Dimensional - dar dimensões determinadas e adequadas de acordo com o que está sendo visualizado;
b)      Bidimensional – dar o dobro das dimensões determinadas adequando-as ao que está sendo visualizado;
c)      Tridimensional – dar as três dimensões do que está sendo visualizado dando a sensação de penetração do relevo visual.

Na descrição visual para referir a forma, tamanho, textura, paladar, cheiro, sentimentos, “olhar”, ou desenhos de forma assimétrica ou simétrica é utilizado, dependendo da situação, uma mão ou duas.







A FORMA, A TEXTURA E O TAMANHO DA MOCHILA








A FORMA E O PALADAR DO ABACAXI








A FORMA, A FORÇA DO JACARÉ







SENTIMENTOS DE UMA PESSOA
SURDA AO PRESTAR VESTIBULAR
EM LIBRAS









OLHAR DE UM HOMEM CIUMENTO E
BRAVO








Há também o classificador descritivo locativo que envolve uma ação que determina o objeto em relação ao outro objeto, seja animado ou inanimado. São usados com uma ou duas configurações de mãos.






SURFANDO






CARRO BATENDO NO POSTE







MOTO VOANDO NA PISTA




ÁRVORE SENDO CORTADA


Outro classificador descritivo envolve uma ação ou posição de várias partes do corpo humano, objetos animados e inanimados.




BOCA DE JACARÉ





LÁGRIMAS SAINDO DOS OLHOS





MENTIR FAZ NARIZ CRESCER




LÍNGUA SABOREANDO COMIDA
GOSTOSA

2) Classificadores especificadores

A sua função é descrever visualmente a forma, o tamanho, a textura, o paladar, o cheiro, os sentimentos, o “olhar”, os “sons” do material, do corpo da pessoa e dos animais.




SOM DO RELÓGIO DO DESPERTADOR



FORMA HUMANA



Há também os classificadores que especificam elementos gasosos.

    
            FUMACA.jpg



FUMAÇA DO CIGARRO
explosao1.JPG


FUMAÇA DA EXPLOSÃO DA BOMBA ATÔMICA



FUMAÇA DO CHURRASCO



FUMAÇA DO FOGÃO A LENHA


Outro especificador é a descrição dos símbolos e nomes das logomarcas.



MCDONALDS





VOLKSWAGEN

                       

PARIS


Também há o classificador especificador que descreve os números relacionados ao objeto animado e inanimado.

           
           



NÚMERO DA CAMISA DE FUTEBOL









NÚMERO DA RESIDÊNCIA








NÚMERO DE TELEFONE




3) Classificadores de plural
A configuração de mão substitui o objeto em si sendo repetido várias vezes.



INDICANDO VÁRIOS LIVROS NA ESTANTE NA POSIÇÃO VERTICAL



EM MOVIMENTO PARA CIMA INDICANDO VÁRIOS LIVROS EMPILHADOS


INDICANDO VÁRIOS CARROS ESTACIONADOS UM AO LADO DO OUTRO




CARROS NO PÁTIO DA FÁBRICA



MUITAS ÁRVORES (FLORESTA)




MUITA GENTE (MULTIDÃO)

Exemplos com a incorporação do objeto repetido várias vezes: um conjunto de potes lado a lado, quadros espalhados na parede.




UM CONJUNTO DE POTES LADO A LADO




QUADROS ESPALHADOS NA PAREDE (ORGANIZADOS)





QUADROS ESPALHADOS NA PAREDE (DESORGANIZADOS)





CADEIRAS NA RODA PARA BRINCADEIRA





CADEIRAS ENFILEIRADAS EM AUDITÓRIO

4) Classificadores instrumentais
É a incorporação do instrumento descrevendo a ação gerada por ele.





USAR A FURADEIRA




USAR O REVÓLVER





PINTAR A PAREDE COM ROLO




PINTAR COM O LÁPIS NO PAPEL




ESCREVER NO PAPEL




ESCREVER NA AREIA



ESCREVER NO TECLADO



ESCOVAR CABELO



ESCOVAR DENTES

5) Classificadores de corpo
É o classificador que descreve como uma ação acontece na realidade por meio da expressão corporal de seres animados.
                       
      



REAÇÃO FACIAL DO GATO






O ANDAR DO CACHORRO





O ANDAR DO ELEFANTE





O CABELO GRANDE
COM FAIXA




O CABELÃO




LEÃO BRAVO

Papel dos classificadores
Nesta parte, vamos listar várias questões que podem estar implicadas nos classificadores.

1) Questões relacionadas à semântica

a) Para o caso de deslocamento de um lugar para outro lugar, quando associado com diferentes formas de olhar, apresentam-se diferentes significados.

CM 16, acompanhar com o olhar o deslocamento, em horizontal, da mão. No contexto da cultura dos surdos, o “olhar” implica diversos sentidos, por exemplo: se olharem para o determinado deslocamento (a mão), os surdos querem defini-lo como pessoa conhecida. Caso contrário, implica pessoas desconhecidas ou pessoas que não querem ser identificadas.
CM 56 mão palma para baixo CARRO PASSANDO

CM 56 mão palma em frente do peito MOTO PASSOU


b) Para caso de homonímia: um classificador pode apresentar diferentes significados, embora apresente a mesma forma.


PESSOA DEITADA NORMAL ou PESSOA CAIU  (CM 49 deitada na outra palma aberta da mão esquerda CM 57 significando deitada ou pessoa caída naquela posição)

DORMINDO MAL ou TROCANDO DE LUGAR NA CAMA (CM 49 virando várias vezes na palma mão CM 57

CM 49 PERNAS LEVANTADAS PRÁ CIMA NA CAMA (CM 57) COMO QUE FAZENDO EXERCÍCIO ou PESSOA-OLHANDO-PARA-CIMA

CM 49 e CM 57 (palma prá baixo) MODELO DESFILANDO ou PESSOA PASSANDO POR CIMA DA PONTE


2) Questões relacionadas à sintaxe

Nas línguas de sinais, assim como na LIBRAS, apresentam-se vários casos de incorporação de argumento ou complemento. Esse processo é muito freqüente e visível devido às características espaciais e icônicas dos sinais. Os exemplos abaixo ilustram esse tipo de incorporação.
a)      Se o objeto direto do verbo for, por exemplo: prato, rosto, etc, o verbo incorporará este argumento e teremos formas verbais diferentes.
Exemplos:
LAVAR-PRATO – Duas CM 57 circulando juntos ao mesmo tempo
LAVAR-ROSTO – Duas CM 57 em movimento circular no rosto
LAVAR-CARRO – Duas CM 1 em movimento circular no espaço neutro
LAVAR-CABELO  - CM 59 com movimento circular
LAVAR-ROUPA – CM 54 associada ao movimento circular na máquina

ESCREVER-PAPEL
ESCREVER-TECLADO
ESCREVER-AREIA
ESCREVER-CELULAR
ESCREVER-QUADRO BRANCO

COMER-ARROZ
COMER-CHURRASCO-PICADO
COMER-PIPOCA
COMER-PIZZA
COMER-SUSHI
COMER-MILHO
COMER-SANDUICHE

b) Incorporação do modo e aspecto

Descrição dos sinais: CM 49 (de ponta dos dedos e de palma para baixo), mover os dedos como se fossem pernas a caminhar ou andar ou andar depressa ou para cima ou para baixo ou em circular ou para frente ou para trás.
ANDAR-DEVAGAR
ANDAR-DEPRESSA
ANDAR-DISTRAÍDA
ANDAR-COM-ATENÇAO
ANDAR-SUBINDO
ANDAR-DESCENDO
Descrição dos sinais: CM 49 (de ponta dos dedos e de palma para baixo), mover os dedos como se estivesse subindo ou descendo de escada. Se for de caracol, mover os dedos em espiral de cima para baixo ou de baixo para cima.
NADAR-BORBOLETA LENTAMENTE, RAPIDAMENTE, NORMAL
CM 33 DUAS PESSOAS PASSARAM EM MINHA FRENTE DEVAGAR - RÁPIDO

CM 61 MÃOS MOVIMENTANDO COMO QUE MUITAS CRIANÇAS PASSARAM EM MINHA FRENTE UMA-VEZ, MUITAS-VEZES, ALGUMAS-VEZES

Descrição dos sinais: CM 13 + CM 12 em movimentos alternados andando de diferentes formas (subindo na árvore, entrando no buraco, andando em cima da grama, etc.).

Descrição dos sinais:  CM 57 em movimento para baixo significando uma folha de papel caindo no chão. Essa folha de papel pode cair de diferentes formas (levemente, rapidamente, em linha reta, em linhas ondulantes, etc.).
FOLHA DE PAPEL CAINDO
FOLHA DE PAPEL VOANDO
JOGAR AVIÃO DE PAPEL AO ALTO
FOLHA DE ÁRVORE CAINDO
MAÇA CAINDO DA ÁRVORE
JABUTICABAS CAINDO DA ÁRVORE

Descrição dos sinais:  CM 8 pressiona na palma da CM 57 + CM 7 na ponta do nariz com o punho fechado para fora do lado direito para lado esquerdo significando que o carro bateu bruscamente. Poderia ser feito de diferentes formas (levemente, vagarosamente, fortemente, etc.).

c) Incorporação de locativo

Descrição dos sinais: CM 29 movendo para baixo colocando o copo na mesa. Poderia ser colocando o copo em outros lugares.
COLOCAR COPO EM MESA
COLOCAR COPO EM ARMÁRIO
Descrição dos sinais: 2 CM 57 formando um quadrado e movendo de um lugar para o outro, colocando em diferentes lugares.

3) Questões relacionadas à morfologia

Descrição dos sinais: CM 45 - moeda com diferentes formas e tamanhos.

Descrição dos sinais: CM 57 em direção para frente com diferentes movimentos (ondulante, plano, zigue-zague, esburacada, etc.).


Referências Bibliográficas

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[1] Baseado no texto da Aikhenvald (2000).

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